quarta-feira, 18 de novembro de 2009

INDIRECTAS ATÍPICAS, VITAMINA OU VENENO

O Exercício Democrático em Angola continua a ser um bico de obras. Aconteceram as eleições, mas à semelhança das primeiras, ficou por eleger-se o presidente da República, por toda uma série de alegações que volta e meia os politólogos procuram esmiuçar. É perfeitamente compreensível que em situações análogas, recaiam suspeições sobre o partido de pertença do presidente no poder, que entre outros aspectos, não precisa de ser participativo, nem ligeiro nos processos que visem dotar de celeridade o mecanismo de eleição de um novo presidente. Sou de opinião que a propósito parece-me que o MPLA, um hábil jogador no gramado político, terá entretanto desperdiçado uma extraordinária oportunidade de fazer brilhar o seu líder, ao não aproveitar o embalo dos 82% das eleições legislativas, criando esteios para que as presidenciais ocorressem de imediato. Julgo extremamente pálidas, quase inexistentes as probabilidades de que José Eduardo saísse derrotado do pleito. Antes pelo contrário, ainda que não igualasse as margens do partido - segundo se diz um quadro com o qual dos Santos não simpatiza- entretanto teria seguramente uma muito boa margem sobre os seus oponentes. Facto porém é que tal não ocorreu, e este ano Angola recebeu a visita de Jacob Zuma, que políticos da oposição e não só, consideraram um pseudo evento que visava lavrar as vias para a introdução da intenção de se copiar o modelo Sul-Africano de eleição presidencial.
Hoje, travam-se de razões os donos de retóricas ou verborreias mais eloquentes, quer do partido no poder como da oposição, no sentido de por um lado com argumentos de razão provarem a eficácia e vantagens da pretensão de José Eduardo e o MPLA, e o outro lado tentar demonstrar a invalidez de tal pretensão. Nisso esgrimem-se argumentos, nos quais tem sido saliente, a gritante incapacidade de alguns estudiosos e membros de partidos políticos, vincularem os seus estudos ao contexto Angolano. Qualquer uma das partes é livre de nas suas acções de demonstração pública de sapiência e razão, invocar toda a sorte de filósofos, historiadores ou políticos, mas é de profunda cordialidade que tais análises não se apartem nunca do contexto nacional, porquanto a virtuosidade de determinadas políticas para uns, pode perfeitamente ser o veneno para outras sociedades. Ou mais grave ainda, estarão a incorrer eventualmente no “imperceptível” erro de a todos considerarem iletrados ou sem os níveis de sofisticação intelectual que permita desconstruir determinados enunciados.
Atendo-me à aspectos inerentes aos hábitos culturais do homem Angolano tenho me questionado em relação a alguns aspectos curiosos. A UNITA defende que as presidências devem ser realizadas ainda a luz da presente constituição. Pergunto-me, que tipo de Presidente teríamos, se um candidato de outro partido vencesse as presidenciais e o MPLA as legislativas com a actual maioria. Partir-se-ia então para uma revisão constitucional, proposta pelo partido maioritário? Porque como se sabe são quase ilimitados os poderes do Presidente da República, segundo o artigo 66 da lei constitucional, ao presidente compete presidir a órgãos como o Conselho de Ministros, Conselho da República, Conselho de Defesa Nacional, nomeia o Governo, sob proposta do Primeiro-ministro, nomeia o Juiz Presidente do tribunal supremo e o Procurador-geral da República ouvido o Conselho Superior da Magistratura Judicial, que por sua vez também é por ele nomeado, nomeia os adjuntos do Procurador-geral, nomeia o Chefe de Estado-maior do exército, sendo comandante em Chefe, nomeia os oficias generais sob proposta do conselho de Defesa nacional, enfim uma infindável listagem de poderes se podem inventariar. Considerando aspectos culturais enraizados na postura do homem Angolano, associados as próprias nuances do exercício político, teríamos seguramente um parlamento bastante meloso no processo de análise das propostas presidenciais, e até certo ponto uma machadada no processo de consolidação do literal conceito de nação. Configurar-se-ia claramente um lapso governamental, na medida em que nenhuma aliança dotaria o presidente do poder indispensável à fuga às pretensões do partido maioritário.
É um quadro, que nada garante que um dia histórico não possa configurar.
Outra análise remete-nos ao facto de que o povo Angolano cujo nível académico tem as limitações conhecidas, sabe que existe um modelo de eleição presidencial, mas que tal passa necessariamente por ele, que vê nisso de resto uma arma susceptível de ser exibida nos momentos de cobrança ou fiscalização dos seus direitos ou do que lhe pareça ser um atropelo as promessas eleitorais. Um pouco do género de, ou ele se porta como deve ser, ou não lhe dou o próximo voto.
Fica a pergunta, como conviverá esse povo, ou com a sensação de sentir que não é directamente tido na escolha de quem comanda os destinos do País? Porque delegar poderes, literalmente não é o mesmo que o exercer de vivo punho.

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